segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

A Cigana e a Moça





Naquelas terras áridas, ao redor daquela fortaleza, onde o sol castigava e a vida não fazia diferente, cada um lutava com suas próprias armas.
Diante de tantas dificuldades, se fazia necessário acreditar em alguma coisa para se dar sentido ao dia a dia. E era exatamente este acreditar que muitas vezes abriam uma perigosa fresta em nossas almas.
Passeando por aquela estradinha do soldado, guardando as flores desenhadas pela caminho (veja meu post de ontem), uma jovem donzela ia, quase que como flutuasse.
Nos seus pensamentos, nada. Apenas o passar daquelas figuras encantadoras e a brisa morna eram seus companheiros. Olhar baixo, ela se deliciava com a caminhada.
Algumas curvas depois do riacho, ela pode perceber o barulho das folhas atrás de seu próprio passo, indicando que alguém a seguia.
Sem nenhum temor, ela continuou o percurso até chegar num enorme canteiro selvagem de alecrim. Respirou fundo, o mais fundo que podia para sentir o cheiro maravilhoso que vinha daquela planta.
Eis que a misteriosa figura que a seguia se fez aparecer. Era uma velha senhora, baixa, quase sem pescoço que a seguia com os olhos, qualquer fosse o movimento que fizesse.
A mulher se apresentou como uma poderosa cigana, que habitava nas colinas, às margens do cemitério. E como se espera de uma serpente, moveu-se rapidamente e pegou a mão daquela moça.
Ela tentou reagir, mas acabou permitindo, não se sabia ainda o porque.
“Você, moça bonita, já chorou muito, mas agora é feliz, encontrou felicidade. Mas existem pessoas invejando isto. Precisa se proteger. Deixa eu te ajudar.”
Se ninguém me ajuda nem a atravessar a rua, imagina se ia aparecer ali no meio daquele mato...pensou ela. Mas em sendo sábia, a moça nada disse. Apenas a guardou profundamente nos olhos como se dissesse: Você tem certeza? Não quer desaparecer daqui tão rápido como chegou?
A megera, ainda agarrada na delicada mão, pressionou ainda mais forte e disse: 
Deixa eu te ajudar, só eu posso!
Bela doce aquela moça, que ao invés de ser logo indelicada, preferiu o caminho da diplomacia. Sorriu, agradeceu e deixou claro que não tinha um só centavo para pagar pela eventual ajuda. E retomou sua caminhada.
Tão rápida quanto na oferta da ajuda foi a mudança de humor da velha.
Irritada por ter seguido por tanto tempo aquela moça, e ter esperado o momento certo para agir, e não habituada a receber um não para suas ameaças do “outro mundo” ela começou a gritar. Desejou e praguejou todo tipo de má sorte imaginável.
Mal sabia ela que, ao contrário de nós, pobre mortais, que não temos muitas armas contra eventuais falsos ataques ciganos, aquela moça era mágica.
Ela virou-se para a velha, e com o mesmo olhar de antes procurou dar uma segunda chance para que ela desistisse.
Claro que não aconteceu.
Então a moça pegou os ramos de alecrim florido que tinha nas mãos e soprou na direção da velha.
O perfume vindo das flores e das folhas do alecrim envolveram a velha como um tufão. Em poucos segundos a sua voz não se fazia mais ouvir. 
As nuvens fugiram, e o sol voltou a brilhar.
No lugar da velha, um imenso maço de alecrim florido se formou.
Só aí a moça falou: agora fique aí, pois é este o seu castigo, falsa cigana. Te aproveitaste das frestas nas almas alheias. Ao invés de ficar aí espalhando a podridão nas crenças alheias, irá, ao contrário, perfumar o caminho de cada ser que aqui passar. E ao sentir este perfume, as pessoas sentirão paz em seus espíritos.
E assim foi.
...ai como eu queria ser mágica de vez em quando...