domingo, 4 de março de 2012

Donzela da Cabeça de Papel


((a estória é boa, mas se vcs vissem a fotografia do Alessandro Giraldi q o inspirou...para ver entre no facebook, user "orchidea fantastica"))

Era uma vez um reino distante. 
Este reino, grande, vasto, imensamente diversificado, era habitado por seres também muito particulares. 
Habitavam ali as mais normais das espécies, como os pombos cinzas das praças, os cachorros que latem inesperadamente em um portão, as andorinhas do fim da tarde e as formigas de jardim.
Mas habitavam também seres menos, digamos, óbvios, como o boto cor de rosa, o bicho-pau, a preguiça...sem falar no estranho “mede palmo”.
E haviam os seres menos seres, como o chupa-cabra, a cuca, a mula sem cabeça, e por aí vai...
Os seres humanos também davam sua contribuição mais do que especial dentro desta diversidade.
E exatamente neste reino nasceu uma bela criança, que não era princesa, chamada Donzela. Nenhum príncipe a beijaria. Não adiantaria ela sair por aí beijando sapos, porque o máximo que poderia acontecer seria ela ter alguma estranha doença, ou uma dermatite. Seria também muito perigosa a idéia de ir se esconder na casa de sete desconhecidos anões.
Diante de tal realidade, só restou a ela crescer e enfrentar o mundo de peito aberto.
Mas isto não era nada fácil.
Voltando ao assunto diversidade, Donzela não se assustou quando teve que sair de casa à noite e dar uma bronca no Saci Pererê, que estava lá fora pregando peças aos cavalos. Menos problemas ainda ela teve quando fazia jogging pela floresta e teve que brigar com o Curupira porque este aí queria instalar um pedágio pelo uso da floresta. Mais adiante ainda teve que se indispor com o Caipora que, bêbado, achou que podia dizer umas gracinhas para nossa caríssima Donzela. Hábil no karatê, bastou um golpe e ela apagou o fogo dele.
Não se assustava com quase nada, porque se assustava quando se via no espelho. A imagem refletida não era jamais o que ela queria ver. 
Apesar do toda a diversidade ao redor, ela era convencida que havia um tal “padrão”. E ela se considerava totalmente fora dele.
Desesperada, tentou de tudo. Mudou de cidade. Pintou os cabelos, fez bronzeamento artificial, musculação, pilates, ioga, escova progressiva e regressiva, unhas de porcelana, francesinha, adesivada, banho de sol, de lua, de marte, de vênus. Tentou de tudo. Mas o olhar no espelho era sempre desaprovador. O tal padrão nunca era conquistado.
Infeliz, nossa Donzela seguiu vivendo como achava que se podia, apegando-se ao fato de que pelo menos a tal fatalidade não poderia piorar.
Mas eis que o fatídico dia do “pior” chegou: Donzela conheceu o amor.
Arrasada, nervosa, mas dinâmica, decidiu que iria pelo menos desfrutar a amizade daquele ser tão agradável. Apaixonada, ela recortou uma revista, colou em um saco de padaria e colocou na cabeça. Plano perfeito.
Donzela e Amado acabaram virando amigos. Conversavam dias e noites, e noites e dias. Toda a floresta ao redor parecia sempre florida quando eles estavam juntos. Harmonia total. Ficaram até amigos do Saci Pererê, do Curupira e do Caipora.
Amado a respeitava assim como ela era, com suas graças e esquisitices. 
Curioso, mas controlado, esperou ter intimidade suficiente para perguntar sobre a cabeça de papel. Donzela, já preparada para a possível pergunta, explicou que voltara recentemente de Londres, e lá é moda...e quem vai discutir se é moda em Londres?
Mas já que Donzela foi sincera e falou de sua esquisitisse, pensou Amado, ele também iria contar a dele. Ele estava ali por aquelas bandas, mas seguiria em breve para outros territórios. Isto porque, apesar do relacionamento lindo, ele estava em busca de um sonho antigo. Queria ir para o reino do Maranhão, numa localidade onde todos os seres eram albinos. Figuras exóticas, fantásticas e cheias de misticismo. Claro que eram pessoas normais, mas ele havia visto um documentário e se apaixonou por uma das donzelas entrevistadas. Tinha que ir atrás do sonho.
A estória está ficando grande aqui para o blog e para a sua paciência? OK, vou resumir...
Claro que a paixão à primeira vista que Amado teve ao ver o documentário era Donzela. Donzela era linda, só que não era o tal “padrão”. Mas e agora, como revelar a verdade a Amado e, digamos, matar o coelho com uma só cajadada?
Bem, burra era a última coisa que se podia dizer que Donzela era.
Despediu-se de Amado e propôs que para o último dia que passariam juntos, ela queria ir à praia. Embora tivesse dito desde o princípio que detestava mar, areia e sol, ela iria fazer o sacrifício pela profunda relação de amizade deles.
No dia seguinte, no horário e local marcado, Donzela estava na praia, em um lindo biquini preto. O tal saco ela tinha tirado da cabeça, mas escondia o rosto com uma destas revistas cheias de fotos de donzelas de outras padronagens.
Quando amado chegou, ela se colocou bem de frente a ele. Ele, sem entender o que estava acontecendo, e sem saber o que fazer, fitava os olhos da fotografia na revista, como se procurasse o brilho dos olhos de Donzela, nunca antes vistos.
Ela tirou a revista.
Ele tirou o sorriso e uma lágrima.
O resto vocês já sabem...se abraçaram, se beijaram e foram felizes para sempre.
Dedico este post aos fotógrafos Renan Rosa e Alessandro Giraldi